Reabertura do prazo para adesão ao REFIS: A crise é do sistema tributário nacional!
Bruno Rocha Cesar Fernandes
Diretor do Instituto dos Advogados de Minas Gerais
Sócio do escritório LRG Aranha Advogados Associados
Especialista em Direito Tributários pela Faculdade Milton Campos
Mestrando pela Thomas Jefferson School of Law – San Diego, California, US
Em 2009 foi aprovado o parcelamento especial que recebeu a alcunha de “Refis da crise” (lei 11.941/09). Recentemente, em 09 de outubro de 2013, houve a conversão da Medida Provisória 615 na lei 12.865/13, oportunidade em que foi reaberto, até 31 de dezembro de 2013, o prazo para adesão ao “Refis da Crise”. A reabertura do prazo de adesão a esse parcelamento não pode ser confundida com um novo parcelamento, tanto que os débitos parceláveis são os mesmos do Refis de 2009, vale dizer, aqueles vencidos até 30 de novembro de 2008.
Essa notícia tem gerado polêmica e uma certa divisão maniqueísta, com críticas contra o próprio benefício do parcelamento ou, lado outro, contrárias às restrições que impedem a inclusão mais ampla de débitos.
Fato é que há muito se discutiu, se discute e se discutirá esse tipo de novidade, sobremaneira enquanto os grandes temas do direito tributário não forem abordados com seriedade. Explico: ao passo que a principal pauta das notícias fiscais for programas de parcelamento, benesses fiscais temporárias, como isenção de IPI, redução de alíquotas e outras tantas, temas verdadeiramente relevantes ficarão à margem do debate sério, técnico e responsável!
Nesse sentido importante lembrar a lição de mestre que hoje, certamente, é um dos mais lúcidos e críticos pensadores do direito tributário brasileiro, o Prof. Ives Gandra da Silva Martins: “O sistema é caótico, com superposição de incidências e elevado nível de complexidade. Gera um custo fantástico de administração para contribuintes e para os diversos Erários, facilitando a sonegação dolosa e impondo, para muitos setores, a inadimplência sobrevivencial, como forma de evitar a falência. Necessita, urgentemente, ser mudado”.[1]
O sistema tributário nacional está em crise. Na última década a arrecadação fiscal rondou a casa dos 40% do PIB. Entretanto, um estudo do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) confirma que dentre os 30 países com as cargas tributárias mais elevadas, o Brasil continua sendo o que proporciona o pior retorno em prol do bem estar social. A carga tributária supera a de países ricos! Enquanto isso, o retorno social, e até o propagado amparo assistencial, continuam lamentáveis. Educação, saúde e segurança ainda estão muito aquém de nossos anseios e possibilidades. Nada disso é novidade!
Parênteses, metajurídico, mas cívico, é o realce do importante papel que a corrupção e falta de planejamento têm nesse cenário, pois são fatores que aumentam o apetite voraz das Fazendas Públicas, principalmente a Federal, cujo leão é mais faminto e agressivo. A carga poderia ser facilmente minorada com eficiência e respeito à coisa pública. Minas Gerais relembra os 70 anos do “Manifesto dos Mineiros”, oportunidade em que a tradição política e cívica de minas demonstra aflorar nova insurgência a favor de mudanças na ordem, ou desordem, nacional.
Voltando a vetores eminentemente fiscais, é preciso rogar pela simplificação da legislação tributária, que enlouquece contadores, advogados e, principalmente, contribuintes. A complexidade muitas vezes impossibilita o pagamento correto e, com isso, acaba impondo juros e multas impagáveis. Exemplo gritante dessa realidade é a pesquisa atual do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário. Nela verifica-se a edição de 290.932 normas em matéria tributária nos primeiros 24 anos da nossa Carta Maior, o que representa mais de 1,4 normas tributárias por hora. Desonerar e desburocratizar a tributação barateia o custo da atividade empresarial, nos faz mais competitivos, aumenta a demanda por empregos, a poupança interna e as receitas fiscais.
A guerra fiscal, a crise federalista fiscal, a superposição de incidência, enfim, são muitos os temas relevantes que necessitam de reforma, tão alardeada, mas ainda tão distante! Quando os reais temas forem objeto de discussão séria, sobremaneira no Poder Executivo central e no Congresso Nacional, não haverá mais necessidade de REFIS, PAES, PAEX ou qualquer outro parcelamento. Quando se alcançar essa meta existirá menor recorrência de notícias sobre paliativos, como o são os parcelamentos especiais.
Assim, até lá sou, SIM, a favor de parcelamentos. Discordo que parcelamento especial seja sinônimo de punição aos bons pagadores. A ideia de mau contribuinte é que está equivocada, a advocacia tributária demonstra que o contribuinte, em regra, quer pagar os impostos, quando não o faz é porque não suporta a elevada carga ou é induzido a erro pela complexidade do próprio sistema. Até sanar o que de fato anda em descompasso, temos que remediar a situação. É o que fazem os programas de recuperação fiscal, UTI’s dos contribuintes brasileiros.
Refis é crise! Mas, nesse caso, não estamos falando da crise econômica deflagrada nos Estados Unidos, que ainda ecoa nos variados rincões do mundo. Refis é crise! Crise do nosso sistema tributário, por tudo que já foi dito, e muito mais. Enquanto o problema não for estudado sob prisma holístico, os parcelamentos ainda serão rediscutidos muitas e muitas vezes. O mais provável: daqui a três ou quatro anos!
[1] MARTINS. Ives Gandra da Silva. Um novo enfoque para os tributos. In: Reforma Tributária em questão. Lauro Morhy (Org.). Brasília: UnB, 2003. p. 45.